sábado, 15 de novembro de 2014

aconteceu no sarau da casa amarela com raberuan


josé

nos últimos dois anos que passaram lançamos dezenas
de livros na casa amarela, tanto no blablablá como no
sarau da casa amarela que acabaram se tornando um
espaço independente para que os novos autores que
estão fora do circuito oficial de distribuição possam
divulgar suas obras literárias. nos últimos dois anos que
passaram a casa amarela lançou livros de escritores e
poetas do quilate de marília kubota, por exemplo, de
vlado lima, márcia barbieri e ademiro alves, o sacolinha,
por exemplo, de alessandro buzzo, alexandre kishimoto
e carlos moreira, e de tantos outros autores, todos da
estirpe dos baitas. mas sou obrigado a confessar que o
lançamento que mais comoveu e encheu meu coração
de alegria foi o do livro do sr josé pessoa, o "esta é a
minha história", no domingo passado no sarau da casa
amarela em homenagem a raberuan. o "esta é a minha
história", contada à maneira do sr josé é a história de
um brasileiro anônimo que migra ainda jovem do norte
para sampa e aqui trabalha a vida inteira na construção
civil e como operário nas fábricas, e faz os sacrifícios
maiores para sobreviver e construir uma casinha na
periferia para morar, apenas mais uma história simples,
comum e anônima. pois esse sr josé, depois de uma
vida inteira dedicada ao trabalho e à sobrevivência, ao
se aposentar decidiu que tinha que fazer alguma coisa
para fugir do ócio, da decadência física e mental e de
simplesmente ficar esperando o dia da morte chegar e
para isso escolheu escolheu escrever um livro na cara
e coragem. sem querer ser piegas o sr josé pessoa é um
exemplo de superação

Akira Yamasaki
novembro/2014






segunda-feira, 13 de outubro de 2014

No 28° Sarau da Casa Amarela : Osnofa encantou, Sidney lançou e Márcio autografou



Foto coletiva do 28° Sarau da Casa Amarela


          Acostumados com os sarau aos domingos, nesse mês, por conta do Dia das Crianças, tivemos o evento realizado em um sábado para mantermos a regularidade. Assim sendo, o 28° Sarau da Casa Amarela aconteceu no dia 11 de outubro, sendo mais uma vez abrilhantado pelas presenças de velhos, novos e novíssimos amigos. Foram mais dois lançamentos de livros e um convidado para lá de especial.
  




          Sidney Leal, que preside a Associação Cultural “Literatura no Brasil” em Suzano, lançou seu livro “Sussurros da Noite – loucura e sonhos”, uma coletânea de contos fantásticos, no melhor estilo “Edgar Alan Poe”, de quem o autor confessa ser fã incondicional. Para falar um pouco do livro, Escobar Franelas ressaltou a qualidade dos textos, dos quais foi leitor quando o livro era tão simplesmente um apanhado de escritos soltos.



          Ao mesmo tempo, o espaço para os autógrafos também era dividido por Márcio Costa,  lançando seu “Justa Palavra”, na Casa Amarela. Como sempre, Akira Yamasaki conseguiu o impossível: fez com que Márcio nos desse uma palha, lendo uma de suas crônicas, presentes no livro. Para comentar sobre o livro, a escritora Enide Santos disse ter posto de lado todas as leituras em andamento para poder degustar o livro, recomendando tão somente a leitura da primeira crônica, pois ela acabaria nos levando a ler o restante do livro.

Enide Santos falando sobre "Justa Palavra", de Márcio Costa


          Zé Afonso, Alemão ou simplesmente Osnofa foi o convidado especial do Sarau. Dono de um repertório único, com um humor cotidiano, ele fez com que suas canções fossem elencadas e pedidas pela plateia que já o conhecia. Com memórias vivas de sua carreira, antes, durante e depois do “Matéria-Prima”, banda que sobrevoava em São Miguel Paulista na década de 80 e de onde saíram grandes nomes como Edvaldo Santana, Zulú de Arrebatá, Éder (Vicente) Lima e o próprio Osnofa; de suas parcerias com tantos outros artistas da região e muito mais.


Akira fazendo a apresentação de Osnofa convidado especial do 28º Sarau
          Quem não conhecia Osnofa, pode ver a “eterna criança” que ele mesmo disse ser, pela sua alegria em estar revivendo e revendo sua trajetória e pela jovialidade que transmitiu quando cantava em seus trocadilhos com canções infantis ou clássicos mundiais do rock n’ roll.

          E como sempre, tivemos o “début”, com duas novas presenças. Ana Lara Pereira, que desde a hora em que entrou na Casa Amarela era só sorrisos pelo encantamento e acolhimento que o ambiente dá, sentou-se e com seu bongô, declamou, cantou e fez acompanhamento para algumas canções de Osnofa.  Logo após Ana Lara, foi a vez de Carla Chagas Passos dar uma palhinha com sua voz “rouca” e potente e, mesmo com um pouco de rouquidão, literalmente falando, ela não se intimidou diante da plateia sedenta de cultura.

Ana Lara e Carla Chagas, debutando no Sarau da Casa Amarela

Sueli agradecendo Euflávio

           Uma surpresa para a Casa foi a despedida da Exposição de Euflávio Góis. Com seu jeito simples, ele agradeceu pelo espaço aberto e disse o quão importante foi a exposição em sua vida. Em retribuição, a Casa foi presenteada com a obra "Homem de cócoras", escultura feita especialmente para a Casa e que ficará exposta permanentemente no local.

         




          Outras figuras também subiram ao pequeno palco da Casa, mas não vamos citar nomes para não cometer injustiças se por acaso esquecermos algum nome.

 


 

          A Casa Amarela tem dessas coisas, encanta, agrega, compartilha, divulga e promove tudo o que de cultura pode haver em qualquer lugar de nosso Brasil, seja do norte com Carlos Moreira e Carvalho Junior, do sul com Bianca Velloso, Mara Pittaluga, do centro-oeste com Neuza Ladeira e Adriane Garcia ou de qualquer pedacinho de chão, onde haja um poeta escrevendo no papel e se não houver o papel a terra seca também servirá para se escrever.

Luka Magalhães

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Ni, Ciríaco, Azenha: como foi blablablar na Casa Amarela em setembro


Arte de Luka Magalhães
Azenha, Ni e Ciríaco, sob os olhos e ouvidos atentos de Eder Lima (foto Celia Maria Ribeiro)


Noite fresca de sábado, uma brisa macia sopra sem força sobre os rostos afogueados da turma da Casa Amarela. Remanescentes de mais um evento no local, o pessoal – atrasado, pra variar – se despede com beijos, abraços, amassos, afagos, ali na Julião Pereira Machado, todos saindo pra outras correrias, outras curtições, outros eventos. Eu e João não, tínhamos compromissos em casa. Todos levantam âncoras e partem para singrar os asfaltos da Sampalândia. Ligo o som do carro bem baixinho, entabulo uma conversa franca e direta com meu caçula e amigo. Em certos momentos, contudo, um silêncio nos surpreende no tráfego tranqüilo da Jacu-Pêssego.
A tarde&noite em companhia dos poetas-boa prosa Ni Brisant, Rodrigo Ciríaco e Bruno Azenha deixou-me em paz, todo relax. O encontro como trio deu-se durante o Blablablá, evento mensal da Casa Amarela – Espaço Cultural, que discute produção artístico-cultural, educação e sustentabilidade no universo periférico. Com o tema “Literatura Marginal – Intenção e Ação”, havia uma curiosidade natural de todos os presentes em ouvir histórias dos protagonistas convidados, todos muitos jovens, com muitos quilômetros rodados já, fazendo a diferença nas comunidades aonde vivem.
Com a tarde estava bem arranjada, o Blablablá começou. No pique de sempre, o casal Éder Lima e Lígia Regina deram a canja poético-musical inicial. Atendendo a uma solicitação do escultor Euflávio Madeirart, que está com muitas de suas obras expostas no local. Ele faz um breve discurso, homenageia de forma muito singela o poeta Akira Yamasaki, um dos gestores da casa. Entrega a ele uma escultura delgada, à Giacometti, confeccionada em pau-brasil, esculpida com o esmero peculiar de seus dedos céleres e sua expressividade única. Akira, irradiado pela surpresa, só sabe corar as maçãs do rosto. E agradecer, e corar, e sorrir. Pela primeira vez, desconfio que o comunicador nato quer sair do palco.
Depois da quebra do protocolo, os convidados enfim ocupam as cadeiras e, provocados por este escriba, iniciam suas histórias, percursos e vivências. O primeiro a comparecer com algumas notas biográficas é Rodrigo Ciríaco: “Educador, comecei o Sarau dos Mesquiteiros em 2007”. Diz que foi o Allan da Rosa que o convidou para lançar o primeiro livro, “Te Pego Lá Fora”, de contos. “Em 2009 fundamos o coletivo e iniciamos as atividades com literatura e teatro”. Acompanhado da Malu, sua princesinha que faz que faz um contraponto à formalidade do momento, Ciríaco prosseguiu, “fui picado por esse bichinho da literatura, na verdade tudo o que tenho hoje, apesar de meu ofício ser educador, devo à literatura”.
As quebras informais ajudam a descontrair. E nisso muito colaborou o próximo convidado a falar. Hilário, o poeta Ni Brisant contou um pouco de sua história. Segundo ele, que chegou em São Paulo em 2005, vindo da Bahia. “Quando cheguei em São Paulo, foi como se eu tivesse saindo da Idade Média”, recordou. Bem humorado, disse que veio para a cidade grande cursar Letras, mesmo que à época não soubesse claramente o que significava estudar Letras. Ni queria explicar o êxtase do encontro com a metrópole, assim como a importância que os saraus adquiriram em sua vida. “Eu não tinha maiores problemas, não era morador de rua, não passava fome, mas desde que descobri os saraus – há uns 4 anos – não fico uma semana sem participar de algum”, disse.
2007 foi ano emblemático também para o terceiro convidado do Blablablá, Bruno Azenha. Contando que foi neste ano que começou a trabalhar com arte na escola Carlos Gomes, no projeto “Café com Poesia” – uma gincana anual do colégio – Azenha comentou que “depois deixei um pouco a poesia de lado, pois passei a fazer outras coisas, arte de rua, teatro, marcenaria, pichação, grafite”. Até que em 2012 ele iniciou, junto com Rafael Carnevalli, Mano Cabelo e outros, um movimento de arte tipicamente juvenil, o Hospício Cultural. Daí derivou para o acontecimento dos saraus. O poeta explicou também que o que o aproximou da Casa Amarela, foi que ele e seu grupo perceberam que o Movimento Aliança do Praça (MPA), iniciado com os membros do Hospício Cultural, tinha coincidentemente as mesmas iniciais do Movimento Popular de Arte (MPA), que também ocupara a Praça do Forró, no centro de São Miguel, desde 1978. Paralelamente, ele inicia, segundo suas palavras, o Sarau Verde, na divisa entre São Miguel e Itaquera, assim como o S.O.M.A., um movimento que mistura ações culturais com trabalhos sociais, como distribuição de roupa, comida e atenção humana para moradores de rua. “Me pego pensando todos os dias sobre o que eu seria hoje sem a arte”, filosofa.
Ainda fazendo analogias entre sua Bahia Natal e a capital paulista, Ni recorta a conversa de forma sintética, “em São Paulo, o cara mais perverso pode estar ao lado do cara mais gente boa”. Falando sobre a significação do espanto diante da urgência da vida urbana, o poeta, que é um dos organizadores do Sarau Sobrenome Liberdade, no Grajaú, e do projeto Ninguém Lê, de encontro de escritores com o público, vai de encontro à poeticidade para exemplificar a sensação da megalópole, “aqui, cordeiros e lobos almoçam no mesmo fast-food”.

"O capitalismo toma tudo de você, até a sua revolta"
Questionado pelo público sobre possíveis influências, Ciríaco confessa sua atenção pelas obras de Plínio Marcos e João Antônio: “gostaria de ser Plínio Marcos”, assume. “Frustrado por não ser ator”, o poeta e contista faz uma leitura crítica da história, onde revê os princípios da contracultura sendo influenciados pelo capitalismo. “Em junho de 2013 tínhamos um movimento pelos 20 centavos que depois virou outra coisa, o capitalismo toma tudo de você, até a sua revolta”, conceitua. Dentro desse mal estar em que uma força maior sempre domina e canaliza as forças revoltosas coletivas e individuais da sociedade, o organizador do Sarau dos Mesquiteiros, do Sarauzim e do Rachão poético permite-se filosofar também, “todo mundo fala mal do diabo, mas ninguém vê que ele é quem faz o trabalho sujo”.
Ni Brisant aproveita uma fenda na conversa e foge para outras searas. Relembra que “arte é fugir do óbvio”, fala do prazer do encontro, da amizade, das vivências fora da lógica capitalista. Bruno Azenha complementa, “a arte já está dentro da pessoa, basta ela achar”. Neste aspecto, relembra o papel primordial da Educação: “um professor de filosofia que eu tinha que foi excepcional em minha vida”.
Rodrigo Ciríaco, também professor de História, pega o gancho: “na escola em que acredito a arte é fundamental”. Pronto! A Educação torna-se o vetor da conversa: “Na escola se ensina a ler e a escrever, não se incentiva a literatura como arte”, arremata ele, para em seguida assegurar que “não que a arte salve, mas fora da arte não tem salvação”.
Convido Daniel Carvalho, professor da rede pública que está visitando o Blablablá, para comentar sobre o livro “Entre Versos Controversos”, que ele organizou com poemas de 15 alunos, na região de Cidade Líder, Itaquera. Daniel fala da experiência da literatura como modificadora das relações e na fruição. Lembrando que antes de ser uma instituição educacional, a escola na verdade é uma instituição política, o também músico e poeta relata que há um movimento claro de modificar a pedagogia para que seja mais coerente com os novos tempos, em tentar ver a relação ensino-aprendizagem em sua totalidade, sem divisões moduladas em disciplinas.
Com a participação de várias pessoas da platéia, o debate avança, sem ameaçar terminar. Ainda assim, com muita vontade de quero mais, aproveito uma brecha para fechar o ciclo dessa conversa. Cumprimos a sina de parar a troca de idéias justamente no momento em que as idéias estão pululando, que nem pipoca na panela. Cada um dos convidados recita um poema, tiramos fotos, trocamos endereços e telefones, nos abraçamos.
É isso, o Blablablá cumpre sua de ser espaço de reflexão e também catalisador de múltiplas expressões, principalmente a do abraço. Todos foram embora, inclusive eu e João. Mas entre os faróis da Jacu-Pêssego reflito já com saudade desse blá blá blá só de bolas dentro.



                                                                                                                        Escobar Franelas

Akira, premiado por Euflávio Madeirart (foto Lígia Regina)

A arte final do Blablablá: sorrisos (foto Célia Maria Ribeiro)


sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Noites Dionisíacas

Livreto do monólogo distribuído no evento
Era uma noite paulistana quase comum. Uma sexta qualquer, uma noite qualquer, depois de um expediente comum a todos os outros dias. Afinal, tudo seguia na mesma. A cidade virou um caos com o quase inerte trânsito costumeiro. Os ônibus circulando abarrotados, o que diminuía as chances de uma viagem tranquila, mesmo com a facilidade da faixa exclusiva. Metrô e trem lotados. Euforia para se preparar para as baladas. Sampa na correria de sempre. Mas, naquela sexta, 19 de setembro, porém, as coisas eram um pouco diferentes. No meio do caminho havia uma casa, uma Casa Amarela.
A ordem do dia era um compromisso com a arte, uma reverência a Dionísio e à magia do fazer teatral. Uma noite dedicada a mais uma vertente artística dentro da Casa Amarela. Vertente não inédita por lá, é bom que se diga, pois a Casa Amarela iniciou seus trabalhos por meio de intervenções cênicas, de pesquisa, oficina e encenação com o Grupo Teatral Alucinógeno Dramático, o qual segue outros promissores caminhos agora, mas é lembrado ainda como um dos expoentes culturais na seara artística da região e com prestígio pelos frequentadores da Casa Amarela.
O evento, batizado temporariamente (ou não, como diria Caetano) como “Sextas Cênicas”, vinha sendo costurado há algum tempo, em conversas de boteco entre Akira Yamasaki, Sueli Kimura, Escobar Franelas, Luka Magalhães e eu, Manogon. Entre bons goles de café (diria garrafas), biscoitos e viagens mil, decidimos colocar à prova a proposta. Como pontapé inicial, em busca de um formato adequado à Casa e viável aos visitantes/frequentadores, diretamente do baú literário de Luka Magalhães, foi marcada a leitura cênica do monólogo “Ascensão, Apogeu e Queda de um Homem Qualquer”.
Manogon dando os últimos toques na maquiagem
 Expectativa e ansiedade, comuns a toda estreia. O público compareceu, embora maior na qualidade que na quantidade, devido a uma série de outros eventos e as dificuldades rotineiras da cidade e adequação de agendas. Papo costumeiro entre os presentes, com direito a café feito pela Sueli, torta de Luka e biscoitos providenciados pelo Escobar. Tudo pronto! Mas antes da leitura da peça, que era o prato principal, um aperitivo: uma performance feita por mim para a canção de Antônio Marcos, Sonho de um Palhaço. A esquete montada foi uma mistura, com pitadas de musical, interpretação e pantomimas, explorando o drama relatado na música. Sete minutos que ajudaram a preparar o clima para a entrada marcante de convidado especial.
Pronto para entrar em cena
Luka Magalhães subiu ao tablado e com mestria começou a expor a beleza de seu texto. Nas palavras de Escobar, um “texto denso, irônico, de sublimação”. A interpretação empregada por Luka para a leitura do monólogo ajudou o público a entrar na história desse homem qualquer. Dividido em três tempos bem definidos, as agruras e satisfações da personagem em sua obsessão de Querer, Ter e Perder, uma busca constante de superação das angústias e sede por vingança por quem o fez sofrer. Mas seria isso mesmo? Seria essa a sua vontade? Um personagem completo e complexo, o que nos fez imaginar e desejar uma montagem digna e com tudo a que tem direito, para um tempo e espaço não distantes.
Emoção na leitura de Luka Magalhães
Após as apresentações aconteceu, com muita descontração, um bate-papo sobre o entendimento do público, as percepções sobre o evento, o desejo que essa iniciativa se repita, ao menos uma vez por mês, numa sexta pré-determinada e também sobre projetos que envolvam as artes cênicas.
O que se pode colher do público é que eventos como esse serão bem-vindos, que a Casa Amarela cumpre com seu papel de fomentar a efervescência artística, que outros textos podem ser lidos, outras cenas devem ser exploradas e outros artistas têm de ser convidados a mostrar sua arte no tablado ou cômodos da Casa Amarela.
Lendo e interpretando o monólogo
Enfim, ficou (e oxalá sempre fique) um gostinho de quero mais...
Aguardem e acompanhem!

Enquanto isso, dia 27 de setembro, sábado, tem mais um BláBláBlá, com outras abordagens sobre o tema Literatura Marginal.
E dia 11 de outubro, domingo, mais uma edição do Sarau da Casa Amarela.
Compareçam para prestigiar e levem sua arte.

Por Manoel Gonçalves (Manogon)

Esse texto foi originalmente publicado na coluna semanal da Casa Amarela no blog da editora Nova Alexandria.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

A Casa Amarela - De Arles a São Miguel Paulista

Grafite de Punky Além da lenda

Grafite de Punky Além da Lenda
Criação e arte gráfica de Luka Magalhães

A Casa Amarela, um espaço cultural fincado numa vila em S. Miguel, periferia de São Paulo, é um local de eventos culturais. Pequena em tamanho mas gigante em acomodação fraterna, a CA, mais do que celebrar unicamente a arte, celebra ali a Arte do encontro, a Arte da vida enquanto pulsação viva, a Arte que postula a independência do homem. Todas as Artes – ou tudo aquilo que você, leitor, entender que é Arte. Se todas as propostas que envolvem as ações humanas celebram o lucro, pleiteiam a vitória (logo, portanto, a derrota de alguém), instauram as relações de poder através das divisas entre os indivíduos, acho compreensível que um local que seja o contrário disso tudo. Um espaço que reúna pessoas exclusivamente para fruir algo em comum – no caso, a deusa Arte – e que seja reverenciado e referenciado como inovador e renovador da vida. Minha ousadia aqui é dizer que a Casa Amarela é isto. É isso.
Pra ficar num exemplo da agenda mais recente, alguns eventos sintetizam essa experiência que aqui tento explicar meio em vão, pois ela (a sensação vivida) é mais forte, intensa, fluida e doce que qualquer menção ou palavra que possa ser dita. O melhor da Arte é a fruição e não sua explicação, bem sabemos disso. O primeiro exemplo que recorto foi o último sarau ocorrido, no dia 13 de setembro, um domingo que ficou curto diante de tanta oferta boa que pudemos desfrutar no exíguo espaço pra tanta gente que se propôs a ter um fim de tarde de domingo para cultuar o espírito poético que vaga ali. O sarau da CA traz sempre um ou mais convidados especiais, que são os artistas que terão, na data acordada, um tempo maior para contar de suas vidas e suas carreiras. No sarau que comento agora, os convidados eram o performático cordelista e ator Costa Senna e o excelente músico e cantor Carlos Bacelar. Além disso, a escritora Andréia Gonçalves Garcia, de Suzano, lançava seu livro “A Viajante do Trem”, um apanhado de crônicas que contam, na maioria das vezes de maneira bem humorada, o dia a dia de quem pega o trem “suburbão” na Sampalândia, mas pode ser em qualquer grande metrópole. Enredos leves, que são uma delícia de se ler, se possível, dentro de um trem lotado saído de Guaianases para a Estação da Luz. E mesmo com essa nata exposta, em todos os saraus 70% do tempo é  de microfone aberto, franqueado ao público presente. Qualquer um que queria mandar sua poesia, declamar, contar “um causo”, atuar, cantar ou tocar, é só chegar e dar o nome para a Lígia e aguardar a vez do Akira chamar. Não tem erro.
Sarau lotado, o evento começa antes das 4 da tarde e avança até quase nove da noite. Pode isso? Claro que pode! A Arte ensina, empiricamente, como pode ser, inclusive, a prática democrática nesses tempos duros que vivemos. Aula de boa política enquanto um verso é recitado “in loco”. Sem grana alguma, a nossa prepotência poética nos faz acreditar que fazemos alguma diferença, pequenina que seja.
...
Menos de uma semana depois a Casa, depois de quase um ano sem um único espetáculo teatral, tem sua programação alterada com a leitura cênica de uma peça escrita por um dos colaboradores do espaço, Luka Magalhães. “Ascensão, Apogeu e Queda de Um Homem Qualquer” é um texto denso, irônico, de sublimação. E a atuação de Luka, catártica, não deixa dúvidas que a montagem do espetáculo deve ser “pra ontem”. Antes, porém, outro colaborador da CA, o artista gráfico, escritor e também ator, apresentou-nos um pequeno esquete baseado numa música que fez muito sucesso na voz de Antônio Marcos, “Sonho de Um Palhaço”. Dois momentos, dois apontamentos de caminho numa mesma noite. Na discussão posterior às apresentações, ficou claro o interesse do público ali presente que essas ações não se encerrem, antes, que continuem se perpetuando em novas idéias e novos afazeres.
Temos comentado sempre que há uma lava incandescente represada em todo o universo, independente da condição periférica ou central. E quando temos locais – como a Casa Amarela – que permitem a erupção poética sem obstáculos, entendemos que há, sim, novos caminhos e possibilidades.
O que nos basta é afirmar. E fazer o que for preciso. Desde os tempos de Van Gogh (ou até antes, quem saberá?), as casas amarelas andam aprontando das suas.

Mais informações:


Escobar Franelas

Akira, em foto de EF

Andréia G. Garcia, em foto de seu arquivo pessoal

Bacelar, em foto de EF

Costa Senna, em foto de Sueli Kimura

Luka Magalhães, em foto de Soraia Milena
Manogon, em foto de Luka Magalhães

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

POESIA, MÚSICA, TEATRO - assim foi o 27º Sarau da Casa Amarela - Luka Magalhães


     Domingo, 14 de setembro de 2014, quase às dez da noite, após o Sarau, como faço às vezes saí em surdina, não me despedindo dos amigos, para tentar absorver e entender a magnitude do evento. Usar retóricas como “foi maravilhoso”, “lindo demais” não faz jus ao que foi e como foi o 27º Sarau da Casa Amarela. É, como diria Ary Toledo, querer adoçar o açúcar.

     Iniciando com Costa Senna, um dos grandes cordelistas da atualidade, a plateia se desmanchou em gargalhadas com suas histórias e se descobriu que algumas pessoas “não tem aquário em casa” (sic).
     O brilho aumentou com as palavras de Andrea Garcia, a “Viajante do Trem”, que fazia o lançamento do seu livro na casa. Com maestria, ela explicou como foi o caminho até chegar à publicação e leu dois textos encantadores, que nos tornam mais viajantes de trem, metrô, ônibus e tal.
    Outra cereja do bolo, Carlos Bacelar, fez uma entrada triunfal. Cantando “Paz do meu Amor” de Luiz Vieira, distribuiu rosas para o público feminino que se fazia presente. Não bastasse isso, sua voz aveludada transformou o Sarau em um cantinho da floresta amazônica, emudecida pelo canto do uirapuru.

Costa Senna (esquerda) Carlos Bacelar (centro) e Adriana Gonçalves Garcia ( direita)

    Mas não foram somente as três cerejas que enalteceram tal bolo. Tivemos participações incríveis e destaco duas performances que impressionaram todo o público. Pela ordem de apresentação tivemos a primeira visita da “Bandadidois e os Covidados Fixos”, grupo formado por Edson Teles, Welton Santos e Marcos Lucius, que apresentaram “Terno Branco & Vermelho” e “Um Cabaré Pra Duas!”. O sarau estagnou com a performance incrível desses meninos de Guarulhos. Foi uma apresentação tão resplendorosa que nosso anfitrião Akira explodiu em gritos para enaltecer essa performance. A outra grande surpresa aconteceu quando Lika Rosa subiu a nosso pequeno tablado e a força de sua voz fez com que as pessoas que já estavam indo embora, voltassem para presenciá-la e poder vê-la ocupando cada canto da Casa Amarela.

Bandadidois e os Convidados Fixos ( Edson Teles, Welton Santos e Marcus Lucius)

   Outras apresentações se juntaram. Tivemos Akira, Escobar, Janete, Rosinha, Romildo, Beto Rio, Silvio Kono, Tião Baia, Tiveron, Terê Cordeiro, Euflavio Góis, e muitos mais. Em especial a presença da ítalo-brasileira (ou brasilo-italiana) Rosana Crispim, que cruzou o Atlântico e aproveitou para rever as amizades brasileiras e nos presentear com suas poesias.




    Nesse Sarau tivemos um bolo com três cerejas e várias fatias saborosamente deliciadas aos pedaços.

domingo, 31 de agosto de 2014

Blablablá de agosto na CA: como foi?



Fotos de Luka Magalhães

O 15º Blábláblá na Casa Amarela, acontecido no último sábado, 30 de agosto, foi realizado sob o impacto da reportagem produzida um mês antes, durante o 14º. Naquela tarde de julho, a equipe comandada pelo Alessandro Buzo fez a cobertura do evento e então a reportagem foi apresentada agora, no quadro Periferia SP, do SPTV 1ª Edição (Rede Globo).
O Blablablá é um encontro de inteligências que mensalmente se reúnem na CA para debater um tema específico. Desta vez, o tema a ser debatido era “Redução da Maioridade Penal: Pra quê? Pra quem?”. E os convidados eram Marcel Cabral, arte-educador e editor do jornal Voz da Leste; Analice Pereira de Campos, psicóloga e pedagoga com larga experiência na formação de professores e estudos de temas ligados aos Direitos Humanos; e Arnaldo Bispo do Rosário, advogado e ex-subprefeito de Ermelino Matarazzo, que traz na bagagem um longo percurso dentro das lutas sociais da região leste desde a década de 1980.
Depois da canja especial proporcionada pelo casal Eder Lima e Lígia Regina, cantando e recitando músicas e poemas que retratam o universo infanto-juvenil, os três convidados apresentaram um pouco de seus percursos biográficos, até começarem a dialogar com o público presente.
Os primeiros apontamentos foram feitos por Marcel que, recorrendo ao pensador Michel Foucault, citou, “a escola é a base do autoritarismo”.  Segundo ele, “o espaço público é o espaço da convivência mas o jovem aprende que espaço bom é o fechado”. Marcel, atualmente professor de História da Arte na ETEC, fez uma defesa apaixonada da educação como desencadeadora de modificações no contexto que vivemos. Apontou distorções de ordem sócio-econômica (“Uma Ferrari é um coisa violenta”), falhas estruturais (“Quem educa hoje é a mídia”) e erros conceituais na relação das pessoas com a memória (“O Carandiru ter virado o Parque da Juventude é um exemplo do apagamento da memória”).
Analice também recorreu a um pensador para embasar seu raciocínio, no caso do sociólogo polonês Zygmut Bauman. “O Marcel falou de Foucault, eu vou de Bauman”, brincou, na introdução de sua fala. A seguir, sentenciou, “é difícil falar de Direitos Humanos sobre a prerrogativa do indivíduo”. Anunciando que questões desse quilate devem ser discutidas dentro de princípios coletivos e não individuais, a pesquisadora exemplificou que qualquer pessoa agredida pensa em reagir pela lógica individual. Mas somente após pensar dentro do contexto do coletivo, é que é possível tomar decisões que são equilibradas e sensatas. Citando exemplarmente que “uma campanha publicitária é feita para quem não pode comprar”, explicou didaticamente como os princípios da frustração, do freio consumista e da auto estima são fundamentais para regular a atuação da criança, do jovem e do adulto dentro da sociedade. Provocada pela platéia, Analice aprofundou diversos questionamentos. O mais emblemático foi quando lembrou que “o fenômeno dos saraus é de extrema importância, mas ainda parece preso a uma certa ´intelectualidade´ periférica”.
Coube a Arnaldo dar cor e forma definitivos aos contornos que se desenharam durante todo o evento. O culto, popular e loquaz advogado impressionou as todos quando, fundamentando-se em dados estatísticos precisos, proclamou,  “Até que estamos vivendo bons tempos atualmente”, explicando depois, “na Roma antiga, os filhos era propriedade dos pais, na Grécia eram propriedade do Estado, os hebreus não podiam mata-los mas podiam vendê-los”. E foi ao ponto: “somos precursores de uma lei muito moderna, o Estatuto da Criança e do Adolescente”. Ainda assim frisou, “agora que a lei foi regulamentada, falta implementar esta lei”. Rotulando que não pode-se combater câncer usando band-aid, Arnaldo esclareceu as diversas possibilidades de uso da lei, inclusive com medidas sócio-educativas, se fosse aplicada na prática: “o aumento da pena para crimes hediondos foi aplicado e foi um fracasso”, apontou.
Deliberando com argumentos ricamente baseados em dados reais, os debatedores, assim como o público participante (participante mesmo, com várias questões problemáticas sendo trazidas à tona!), no fim ficamos todos com a certeza (agora explicitada de maneira quase didática), de que a redução da maioridade penal – se aprovada – será um grande retrocesso nas conquistas sociais que o Brasil tem avançado nas últimas décadas. O sistema precisa de muitas correções de rota, nisso todos concordam. Contudo, é preciso, como quer Arnaldo, que o jovem não seja tratado como assunto policial mas sim como ser social. Corremos sempre o risco – preconizado por Analice – de que a fatura dessa conta seja paga sempre pelo jovem pobre, preto e periférico. Pois, como disse Marcel em dado momento, “só quem vai preso é filho de preso”. É preciso muita lucidez para equilibrar essa conta.


Escobar Franelas

Foto de Lígia Regina

Arte de Manogon