domingo, 28 de julho de 2013

5º Blablablá na CA: Como foi?



Ivan Neris, Escobar Franelas e Xico Edu (foto: arquivo pessoal S.Kimura/A. Yamasaki)
 Para um público que oscilou entre 50 e 60 pessoas, apesar da tarde fria e da ausência de um dos convidados (a profª Vânia Cardoso Coelho), Xico Edu e Ivan Néris não deixaram pedra sobre pedra durante o 5º Blábláblá na Casa Amarela. Roda de debates que procura discutir questões referentes à produção artístico-cultural, pedagógica e ambiental no universo das periferias – ou seja, longe dos grandes núcleos midiáticos e de ganhos financeiros ostensivos – o evento mensal da CA tem se revelado um mecanismo muito produtivo na busca de alternativas para o fomento da construção de um conhecimento mais amplo, assim como espaço de expressão e busca de sincronicidade entre os produtores e pensadores que gravitam em torno do tema.

Formado em Engenharia e Filosofia, com um extenso currículo de lutas sociais, onde imbricam a formação “in loco” com Paulo Freire junto com outros ativistas da zona leste de São Paulo ainda na década de 1970, além de ter trabalhado na produção de shows e empresário bem sucedido no ramo gastronômico, Xico Edu, contudo, iniciou a fala discorrendo sobre um assunto que domina no presente. “É possível pensar a educação e a cultura voltadas para a prática da sustentabilidade”, disse ele, que atualmente trabalha com implantação de logística reversa (otimização do fluxo inverso do produto na cadeia produtiva, ou seja, reciclagem, reúso, recall, devoluções e outras atribuições) para grandes corporações, como o grupo Eurofarma e a Editora Abril. A idéia era debater novas possibilidades nas atividades do homem que impliquem uma relação mais duradoura e saudável entre o homem e a sociedade enquanto cadeia produtiva. Mal inaugurou sua fala, porém, e o assunto foi desviado para a produção artística, por conta dos apontamentos trazidos pela platéia.

A seguir Ivan Néris definiu-se, “sou um artista por natureza, e como artista me coloco”. Filho de São Miguel mas morando atualmente em Recife, Ivan transita com desenvoltura entre a arte teatral e a literária. Inquirido sobre sua iniciação, citou que “a primeira figura do MPA que conheci foi o Sacha”. Nota: MPA é o Movimento Popular de Arte, que surgiu em dezembro de 1978 em São Miguel e foi uma das balizas para toda a militância cultural, artística e política no período em São Paulo, sendo Sacha Arcanjo um dos principais protagonistas dessa cena até os dias de hoje.  Complementando aquilo que o dramaturgo dizia, Xico Edu lembrou que “a primeira ong que vi no Brasil foi o MPA”. Referia-se, assim, ao fato da organização estrutural e burocrática que o movimento comportou durante alguns anos.

Rafael Carnevalli, jovem de apenas 24 anos que organiza dois saraus no centro de São Miguel atualmente, sintetizou este raciocínio dizendo “acho que, como artista, a burocracia é fundamental. Mas também acho que o artista deve ser multifuncional”.

Zé Carlos Batalhafam, poeta e produtor cultural da região – e que já participou de uma edição anterior do Blábláblá – trouxe uma dúvida muito perspicaz. “Gerenciar um produto cultural não é o mesmo que fazer um produto cultural”, definiu para em seguida, questionar “é possível fazer, por exemplo, essa Casa Amarela distante da burocracia do Estado?”, sendo complementado por uma observação trazida por Eder Vicente, educador, músico e artista visual, que comentou, “o artista não pode depender de editais”.

Ivan saiu-se com essa, “tudo isso é relativo, pois eu, por exemplo tenho quem me banque. Mas tem artistas que dependem de sua arte e precisam se bancar de alguma forma”. “O artista faz parte da sociedade civil, e tem que ser independente sempre”, arrematou Xico.

Mais algumas colocações foram trazidas pelo público, o que enriqueceu severamente o debate. Entre as premissas lançadas, veio uma de Francisco Ferreira, também com forte produção cultural na região da Penha. Analisando de maneira cronológica os acontecimentos em São Paulo em tempos passados com o momento atual, disse “tanto o Lira Paulistana quanto o MPA foram grupos artísticos. O que acontece é que hoje os artistas não constituem seus grupos”. Ivan concordou, “a gente perdeu o espírito de solidarizar-se, não no sentido religioso, mas no sentido estrito da palavra”.

A problemática que se oferece no momento atual foi, como em outros Blábláblás, esmiuçada e identificada em várias de suas faces. Todos entendem que realmente as discussões que são trazidas à tona são mito pertinentes, até porque Akira Yamasaki, um dos gestores da C, poeta elogiadíssimo e também produtor cultural relevante na região, apresentou alguns tópicos que são demandas nascidas nas discussões do MPA. Citou ele que “a falta de espaço para manifestação dos artistas e suas artes, a necessidade de fazer nascer uma incubadora (casa de formação), o registro da memória de todas as ações executadas e a formação de público são os quatro pilares por onde deve-se pensar tudo o que está sendo feito até aqui”.

Ao que Xico, sagaz, complementou, “o problema da arte é que a gente precisa de grana, fundamentalmente de talentos e, às vezes, de sorte”.

Várias questões foram trazidas para a roda, como as aulas com o mestre Paulo Freire e a aplicação de sua metodologia no trabalho feito dentro da comunidade Vila Reis, zona leste paulistana, na década de 1970 e que, segundo relato Selma Baia, ainda perdura até hoje com seus resultados altamente positivos.

No fim, Lígia Regina e Eder Lima apresentaram uma versão acústica (voz e violão) de Pássaro Cigano, música de Akira e Edvaldo Santana. Tudo isso para fechar com chave de ouro uma conversa riquíssima em conteúdo.

Texto de Escobar Franelas

Fotos: arquivo pessoal S. Kimura/A. Yamasaki

Ligia, Zulu, Regina Vilela, Batalhafam, Akira, Xico e Eder (foto: arquivo pessoal S.Kimura/A. Yamasaki)
Antecedendo Blablablá, Akira dá depoimento sobre movimentação cultural (foto Célia Yamasaki)

Iolanda e Patricia - público curioso e generoso na CA (foto Xavier)

Eu, entre pensadores (foto Xavier)

A nova geração poética de S. Miguel já está dando as caras (foto Xavier)

Múltiplos interesses para um público diverso (foto Xavier)

Xico Edu, apontamentos da maturidade (foto Xavier)
Bolo pelo aniversário de Celinha Yamasaki (foto Xavier)
Lígia cantando Pássaro Cigano (foto Xavier)
As belas da Casa Amarela - "mulheres que pensam" (foto Xavier)

Xavier (foto: arquivo pessoal S.Kimura/A. Yamasaki)


sexta-feira, 19 de julho de 2013

Sarau da CA recebe João Caetano: como foi?


João Caetano do Nascimento: poemas ruidosos e líricos
Akira Yamasaki, Lígia Regina, Éder Lima, Gildo Passos, Gilberto Braz, Manogon, Escobar Franelas, Luka Magalhães, Grupo Teatral Diotéspissio, Arnaldo Bispo, Ronaldo Ferro. Foram esses os mosqueteiros que dividiram o microfone com o poeta e jornalista João Caetano do Nascimento, no 15º Sarau da Casa Amarela no último domingo, dia 14. Dirigido por Akira Yamasaki, o sarau é um ato de resistência que caminha para o terceiro ano de vida.
Poemas para uma plateia ávida
João Caetano, que tem uma longa página escrita em São Miguel e região. Com a humildade que já é sua marca registrada, reconheceu a dificuldade de estar à frente de um microfone, um ambiente com o qual não convive muito. "Estou nervoso", confessou, logo no inicio do evento. Mas logo seus poemas passaram a temperar a tarde com o belo por do sol que se anunciava. E todos então tiveram o direito a um prazer não terreno, tampouco divino, o prazer da degustação da deusa Poesia. Que ele escreve e destilou com clareza, inspiração e delicadeza.
Inquirido pela plateia, João fez mais, contou histórias do arco da velha, rememorou fatos, tirou a cortina de nomes importantes, colocou pingos nos is.
E o público, ávido, não abria mão de ouvi-lo. E o poeta convidado, contrito, trazia suas impressões do mundo. "Sou um militante identificado com as lutas da esquerda", disse, "por isso mesmo sou profundamente vinculado com as questões de cidadania, cultura, arte e política", complementou. 
Por conta da heterogeneidade dos convidados presentes - justamente por isso mesmo - houve momentos de discussão acalorada, com abordagem de assuntos não previstos para um sarau, como democracia, manifestações jovens e  movimentos políticos.
Com isso, o brinde ficou para todos que, numa ação que pretensamente era única, exclusiva e puramente artística, permitiu que ganhássemos um adensamento político e cultural totalmente aderido às nossas práticas e anseios. É o público hoje quem conduz e protagoniza junto com o artista. E quem viveu e curtiu o Srau da Casa Amarela que tinha como convidado o João Caetano, levou de bônus a adrenalina e a experenciação de outros saberes.
Interações: uma peculiaridade do Sarau da CA
Verônica Lopes: embaixadora do Sarau da Maria em São Miguel

Diostéspissio: excerto de Nozland - abertura


O poeta no seu devido lugar

O tradicional brinde de abertura dos eventos da CA
Manogon: artista múltiplo artista

Akira, João e Lígia: atenção aos assuntos

texto de Escobar Franelas
fotos do arquivo pessoal de S.Kimura/A.Yamasaki