Kishimoto, Inês e João - resistência audiovisual, cultural e social (foto: arquivo Lígia Regina/Éder Lima) |
1º Blablablá do ano: como foi?
Posso iniciar esse rascunho falando uma besteira enorme (minha
especialidade, aliás), mas uma das coisas que tenho mais curtido nos últimos
tempos é “antes e depois” dos eventos na Casa Amarela. Além dos próprios
eventos, é claro!
Ontem (22 de fevereiro), por exemplo, para a primeira edição do Blablablá
em 2014, convidamos o antropólogo e pesquisador Alexandre Kishimoto, autor do
livro “Cinema Japonês na Liberdade” (Ed. Estação Liberdade), o cineasta João
Brito e a professora e também cineasta Inês Santos para um bate-papo com o
público
Antes, porém, a conversa informal rolou solta. Angel e Fábio,
representando a Estação Liberdade, montando um pequeno estande dentro do
espaço, com muitas obras do cast da editora, foram os primeiros a chegar. O
insuperável café da Celinha Yamasaki operava suas maravilhas no olfato da audiência, havia uma grande dispersão no ar, grupos animados confabulavam e rolava
uma intensas troca de ideias, números de celulares, cartões de visita e abraços. Aos
poucos a Casa foi enchendo, ganhando gente...
Dada a hora a mais nas conversas, eis que iniciamos o evento,
com o violão primoroso de Éder Lima acompanhando a voz maviosa de Lígia Regina,
sua musa e intérprete refinada. Estava dada a largada.
Convidados a se apresentarem, Inês, João e Alexandre não se fizeram de
rogados. Compartilharam suas experiências, lançaram propostas, criticaram,
sugeriram. Somaram, multiplicaram.
Já na apresentação, João Brito (de filmes como "Botinas no Elevador" e "Futricando na Vila Mara", "independentes", entre outros), soltou essa: “cursei Eletrônica. E usei a
Eletrônica para entrar no mundo do cinema”. E confessou mais, “tinha uma loja onde
arrumava projetores”. No seu turno, Inês sentenciou que “a minha experiência
com o cinema marcou a minha relação com a arte”. sobrava ironia em um, poesia em outra.
Logo os convidados começaram a ser inquiridos por uma platéia vibrante e
curiosa, num diálogo prazeroso, onde a troca de experiências e profusão de
idéias foi o tônus vital. No meio do burburinho de perguntas e respostas, em
dado momento Alexandre Kishimoto foi questionado sobre como nasceu seu
interesse pelo cinema japonês enquanto investigação antropológica
e sociológica. E ele, com argúcia fundamentada e calma zen, mandou
essa: “o cinema japonês era uma ritualização. Ir ao cinema na Liberdade era um evento
social e cultural”.
Esse foi, segundo o pesquisador, um dos motes para sua
pesquisa. Outros, ainda segundo Alexandre, têm a ver com suas origens nipônica,
a paixão pelo cinema e a procura pelo entendimento dessa força avassaladora,
que era o cinema de rua até algumas décadas atrás. Em seu livro “Cinema Japonês na Liberdade”, ele afirma que na década de
1950, o bairro da Liberdade, em
São Paulo, chegou a ter quatro salas de cinemas dedicadas
exclusivamente ao cinema japonês. Fato que ele confirmou durante sua palestra
no Blablablá.
Com poucas divergências em seus apontamentos, os três convidados ainda
assim reafirmaram suas personalíssimas observações. Como a dedução arguta de
Inês,quando falava de seus conhecimentos do universo infantil. “A arte, na
educação, não tem reconhecimento. Nem valor de conhecimento”, lamentou ela.
E o inflamado João Brito, ainda falando de suas iniciações, lembrou que quando
estudava Rádio e TV, no SENAI, paradoxalmente, não tinha tv em casa.
E já que estamos voltando às memórias iniciais do encontro, vale lembrar que depois
do questionamento de Carlos Bacelar, músico, que logo na primeira rodada de
participação do público, perguntou a Kishimoto sobre o porquê de seus estudos étnicos
brasileiros, este afirmou: “porque as comunidades negras e suas manifestações podem ter várias
citações em São Paulo
e Rio de Janeiro, mas localmente, fora dos grandes centros, elas sofrem muito, principalmente a
intolerância religiosa”.
O balanço final do Blablablá indica que o caminho que a Casa Amarela está
fazendo, oferece alguma luz, indica possíveis saídas
e propõe portas de entrada. Se pudermos
usar este primeiro encontro como exemplo, é plausível que acreditemos que
outros significarão ainda mais possibilidades, no cardápio que estamos propondo
para a cultura e a sociedade de São Miguel, de São Paulo, do Brasil e do mundo. Pois inteligências como as de Inês Santos, Alexandre Kishimoto, João
Brito e do inquieto e vário público não podem ser desperdiçadas. Elas somam. E
multiplicam.
Ah, sim, depois do apito final, ficamos mais de uma hora entre cervejas,
café, petiscaria e papo a granel. E o rico sortimento literário que a editora
Estação Liberdade trouxe para a casa. Eu mesmo voltei pra casa com 6 livros
novos.
Escobar Franelas
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