sexta-feira, 24 de abril de 2015

XXXIII Sarau da Casa Amarela - Resenha de Gilberto Braz



É show, é gol!
Eram 15h:10 min quando cheguei na Casa Amarela neste domingo de semifinais e clássicos históricos: o derbi paulista, Corinthians x Palmeiras, que teria lugar aqui pertinho, em Itaquera; e o não menos tradicional clássico SanSão a ser disputado nos domínios santistas. Mas enganava-se quem pensava que haviam duas disputas. Na verdade, as duas disputas eram três, porque tão logo cheguei, corri os olhos pela casa e vi que éramos poucos. Alguem comentou sobre a concorrência desleal da Globo, marcando os jogos para o mesmo horário do Sarau da Casa Amarela. Dos habituais frequentadores, apenas eu e Luka Magalhães. Além de nós, Carlos Mahlungo, Odair e Ricardo Peçanha cuidavam de plugar os instrumentos para iniciar a passagem de som. Não mais do que 4 lugares estavam ocupados, um deles por Antônio Mioto, outro por Germano Gonçalves. Da coxia imaginária, Mahlungo abriu a cortina e espiou pela fresta. Alguem comentou: "é, hoje tem jogo..." Eu tratei de tranquilizar: daqui a pouco o pessoal começa a chegar e isso aqui vai encher. E aos poucos o pessoal foi chegando. Como não temos compromisso com a TV, com publicidade ou com grade de programação, demos aquela atrasadinha para que os amigos, entre beijos e abraços, pudessem celebrar a arte do encontro .

O relógio marcava exatamente 16h:14min quando Akira Yamasaki subiu ao palco para abrir o 33º Sarau da Casa Amarela. Em breves palavras declamou um poema. Primoroso. Humilde, preparou o clima, e convidou este escriba para anunciar a primeira das muitas atrações especialíssimas da tarde/noite do domingo de duplo clássico que teve a acirrada concorrência da Casa Amarela. Então chamei ao palco Carlos Mahlungo, que veio acompanhado de seu violão e da percussão maneira e cheia de gingas do Odair. Diante de olhares e ouvidos atentos, Mahlungo cantou Outros Olhos, e nos brindou com toda a poesia e musicalidade das Minas Gerais. Borboletou em seguida, com sua voz melodiosa de seda. E para quem queria saber quanto estava o jogo, não se fez de rogado, e respondeu com Flores na Porta do Gol. Mahlungo é show, é gol!, como diz sua música. Então fomos para o intervalo.
Na volta, o gramado, digo, o palco da Casa Amarela recebeu dois craques: Manogon Manoel Gonçalves e Germano Gonçalves, o urbanista concreto. Manogon, escritor, ator, dramaturgo e artista gráfico, convidado especialíssimo, deu-nos a honra de lançar o seu livro de poemas, Caminhos Tortos, editado dentro da coleção Exemplos. Trouxe todo o seu lirismo, em poemas densos e intensos. Em seguida foi a vez de outro convidado especial da tarde. O urbanista concreto, Germano Gonçalves, contou-nos parte de sua trajetória, da descoberta da literatura ao ato de escrever. Da vontade de publicar um livro aos muitos "nãos", verdadeiros tapas na cara que quase todo artista da periferia recebe da "mão invisível do mercado". Mas ele prosseguiu, e nos deliciamos com sua crônica viva; todos rimos, porque a gente costuma rir da própria desgraça depois que ela passa. Mas a coisa foi ficando séria, e o Urbanista contou num poema a história de uma criança, um menino que atirava para tudo quanto é lado, para tudo quanto é alvo: pa! pa!, pa!. E nos conduziu pela história daquele muleque, que não parou de atirar nem quando chegou a polícia: pa! pa!, pa! . E emocionou a todos quando finalmente revelou que o menino atirava pa! pa! palavras...

Até aí, goleada da Casa Amarela sobre a programação fútil do entretenimento massificante. Mas tinha mais. Tinha muito mais. Palco livre, microfone aberto, emprestaram o seu talento maravilhosos artistas da estirpe de Santiago Dias, Mauri de Noronha, que nos agraciou com sua visita pela primeira vez, seo José Pessoa, encantador, e agora cantor!, Mario Neves, sempre com grande estilo, Andrea Garcia, a viajante do Trem, Ricardo Peçanha, músico, cantor, compositor, também estreando, Edinho Twin e Val Branco, cujo indiscutível talento traz aquele profundo silêncio para que os acordes de Twin e a declamação perfeita e singular de Val possam reverberar pela Casa e nos encher os olhos de lágrimas... Paulinho Dhi Andrade, visceral. Ainda tivemos muitos outros artistas e para fechar a noite em grande estilo: Sacha Arcanjo, que deu quatro saideras pra contemplar a todos com suas canções explêndidas.

Foi uma tarde/noite memorável, mais uma vez. Ao final, o Akira e o Escobar ainda levaram de lambuja a felicidade de saber que o seu Palmeiras havia eliminado o Coringão da semifinal. Como na música de Mahlungo: Casa Amarela é Show! É Gooooollll!!!!!. É isso. E em maio tem mais.

Gilberto Braz

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