Foto Luka Magalhães |
Com mediação do poeta Akira Yamasaki, a Casa Amarela realizou ontem, 24 de fevereiro, o primeiro I&I do ano, a roda bimestral de produção literária. O tema proposto pelo Akira foi A Verdade, e contou a participação especial do professor, escritor e filósofo Daniel Lopes Guaccaluz, que apresentou uma introdução sobre o tema a partir da filosofia. Após, foram lidos e comentados os textos produzidos pelas pessoas presentes.
O evento é uma produção bimestral d´A Casa Amarela - Espaço Cultural. Nele, um tema é proposto um mês antes e as pessoas interessadas escrevem poemas, contos, crônicas ou qualquer outro gênero literário e levam para leitura, apreciação, comentários, críticas e até elogios.
Akira - foto de Rosinha Morais |
Os textos lidos e comentados em roda, foram:
A Verdade (excerto de Daniel Lopes Guaccaluz) - introdução ao tema:
"A busca da verdade sempre foi a preocupação de muitos pensadores ao longo da história da filosofia. Para Gilles Deleuze não, a verdade nunca foi uma preocupação. Mais importante que a busca da verdade, seria a construção de sentido, principalmente porque o conceito de verdade sempre esteve ligado à representação e à imagem dogmática do pensamento. Deleuze relaciona aquilo que chama de imagem dogmática do pensamento a diversos filósofos, de Platão a Hegel, passando por Descartes e Kant. No terceiro capítulo de Diferença e repetição o filósofo francês, em oito postulados, elenca, analisa e constrói uma crítica contundente aos fundamentos da imagem dogmática. De maneira resumida, a filosofia assim concebida teria três teses essenciais: 1º – O filósofo, enquanto pensador, quer e ama o verdadeiro. O pensamento, por seu turno, contém o verdadeiro que se mostra por meio do exercício natural e cooperativo das faculdades, supõe-se assim uma natureza reta do pensamento e o bom-senso universalmente partilhado. Pensar seria, aqui, o encontro com a verdade que se entrega ao pensador por meio de um método eficiente. 2º – O corpo, as paixões e os sentidos nos desviam do verdadeiro, são obstáculos ao pensamento. Induzem aquele que quer pensar ao erro, ao falso. 3º – É preciso um método para pensarmos bem e verdadeiramente. Deleuze encontra e expõe inúmeras falhas na filosofia assim concebida. Para o filósofo da diferença, e aqui há um nítido diálogo com Heidegger, talvez nem sequer tenhamos pensado ainda. A imagem dogmática concebe o pensamento a partir da reminiscência e da recognição.
A verdade é, portanto, uma construção de sentido. Seguindo os passos de Nietzsche, Deleuze percebe que muitas forças operam sobre a verdade. Ela é a realização de um valor e existem valores nobres e vis, valores do senhor e do escravo, valores de bom gosto e de mau gosto. A imagem dogmática supõe que a verdade seja algo bom, um universal abstrato ligado à ideia do Bem, mas não existiriam verdades que são da baixeza? Verdades coniventes com os poderes instituídos? Para a filosofia da representação, que é o mesmo que a imagem dogmática, “a verdade aparece como uma criatura bonachona e amiga das comodidades, que dá sem cessar a todos os poderes estabelecidos segurança de que jamais causará a alguém o menor embaraço.”
Afinal há uma verdade universal ou a verdade é uma construção histórica?"
Márcia Barbieri e Daniel Lopes - foto de Luka Magalhães |
Gilberto Braz:
Texto de Angelina Neves (Moçambique):
Afinal, há uma verdade universal ou a verdade é uma construção histórica?
Acredito que a História é uma forma de contar histórias, mitos, uma forma de registo de contos orais... como Ursula K. Le Guin acho que "A história não é uma ciência, é uma arte. ... narrar histórias é uma ferramenta para sabermos quem somos e o que queremos."
E de uma forma prefeita, ela acrescenta : - "uma das funções da arte é dar às pessoas as palavras para conhecerem as suas próprias experiências. Há sempre áreas de vastos silêncios em qualquer cultura, e parte da tarefa dum artista é entrar nessas áreas e regressar do silêncio com alguma coisa a dizer. É uma das razões porque lemos poesia, porque os poetas podem dar-nos as palavras que precisamos."
Também gostei da forma como diz James Baldwin: - " Um artista é uma espécie de historiador espiritual. O seu papel é fazer-te compreender a desgraça e a glória de saberes quem és"
Fiquei curiosa de saber o que pensavam alguns pensadores sobre a Verdade... Decidi por-me à escuta (a ler!) e reunir as várias verdades como se se tratasse duma "conversa" entre famosos (filósofos, escritores, poetas), cada um com a sua definição, a sua "verdade" sobre a verdade! Num diz que diz ... não é um estudo aprofundado, não é uma coisa "com pés e cabeça", organizada, é assim, à sorte: ver, gostar, recolher!
Ernesto Sábato: "Creio que a verdade é perfeita para a matemática, a química, a filosofia, mas não para a vida. Na vida contam mais a ilusão, a imaginação, o desejo, a esperança."
Blaise Pascal: "É uma doença do homem acreditar que possui a verdade"
William Osler: "Quando procuramos a Verdade absoluta nós procuramos o inalcançavel e devemos contentar-nos com porções quebradas." e acrescenta, já como médico, que "A Medicina é uma ciência da incerteza e uma arte das probablidades"
Charles Swindoll: "Estou convencido de que a vida é 10% do que me acontece e 90% de como eu reajo a ela.
Friedrich Nietzsche: "não há factos só interpretações"
Virgina Woolf: "Embora nós todos vejamos o mesmo mundo, todos nós vemo-lo com olhos diferentes."
Michael Neill: "A mente não é uma camara, é um projetor. Não podemos dizer a diferença entre uma experiência imaginada "aqui" e o que está a acontecer "lá fora" - e essa confusão cria muita confusão "
Anais Nin: "Não vemos o mundo como é; vemos o mundo como somos."
Rene Descartes : "Não descrevemos o mundo como o vemos, nós vemos o mundo que podemos descrever" e diz também: - "se fores um verdadeiro pesquisador da Verdade, é necessário que pelo menos uma vez na tua vida tenhas duvidado, tanto quanto possível, de todas as coisas."
Muhammad Iqbal: "O objetivo final do ego não é ver algo, mas ser algo." e para Iqbal, "quando a verdade não queima é filosofia, quando ela fica a queimar a partir do coração, torna-se poesia. "
Henry David Thoreau: "Poesia sugere toda a verdade, filosofia expressa somente partículas dela."
Filipe Russo (Asfixia): - " Eu apreendo a verdade toda esquartejada pela figuração dos sentidos"
Aesop: "Toda verdade tem dois lados; é bom olhar para ambos, antes de nos comprometermos com algum deles".
Bertolt Brecht: "Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso"
Mahatma Gandhi : "Não há Deus maior que a Verdade" ou " Mesmo que sejas a minoria de um, a verdade é a verdade"
José Saramago: "aprendi a não tentar convencer ninguém. O trabalho de convencer é uma falta de respeito. É uma tentativa de colonização do outro.
Osho: "Se desejas ver a verdade, então não te agarres a nenhuma opinião a favor ou contra. "
Albert Camus: "O absurdo é o conceito essencial e a primeira verdade".
de qualquer modo isto tudo é para esquecer!
Confucius: "Estar errado não é nada, a não ser que tu continues a lembrar-te disso"
E agora me digam, sinceramente: se a vida não é o que nós estamos a ver mas o que estamos a projectar, se não é exactamente o que experimentamos mas aquilo lembramos, se é o que contamos e nos serve e não o que parecer ter sido ou não, se o que sentimos é só aquilo que decidimos... então quem sou eu? quem és tu ? quem somos nós alem de uma ideia?
somos a pura ilusão
de possuirmos uma televisão
de amar e querer
de um trabalho a fazer
de ter companheiros
somos uma ideia de ser
a soma dum passado imaginado
e das condições encontradas
que podem ter sido inventadas
escritas, reescritas e recriadas!
Como Socrates: - “Só sei que nada sei."
Eder - foto de Rosinha Morais |
Texto de Eder Lima:
"Nas variadas concepções de Verdade, a saber:
1- Verdade enquanto correspondência;
2- Verdade enquanto revelação;
3- Verdade enquanto conformidade a uma regra;
4- Verdade enquanto coerência;
5- Verdade enquanto utilidade.
a primeira e a segunda concepções disputam a hegemonia no mundo ocidental. Segundo Aristoteles, a Verdade ‘enquanto correspondencia’ estaria no pensamento e na linguagem e não no ser ou na coisa. Pois bem, essa concepção perpassa o conhecimento ocidental século a dentro até ser questionada pelos pensadores contemporâneos que buscam o resgate do ser em detrimento da secularização do ente contida na metafisica racionalista desde de Platão até Hegel.
No segundo caso, a verdade enquanto reveleção, ou enquanto algo que se revela nos diz que uma coisa é, simplesmente, pelo fato de ser, independente de sua qualidade. No entanto, essa ideiao pode ser entendida de dois pontos de vista: empiricamente ou teológicamente, em que ambas perpassam a concepção dogmatica de verdade.
Agora, quando pensamos a verdade a partir de uma concepção fenomenológica da forma como contida em Husserl, devemos pressupor que “as próprias coisas manifestem sua essência” enquando verdade (Abagnano. P.997). Esse pressuposto influenciaria Heidegger e este nos apresentaria, a partir de uma fenomenologia hermnêutica existenbcialista a idéia de verdade enquanto algo que se desvela, que se desencobre, a partir da palavra grega para a verdade (aletheia) ou seja, o modo de ser da verdade em relação ao modo de ser do homem, o ser-ai (Dasein). Resgatando o enunciado pré-socrático de Parmênides: O Ser é, o não Ser não é!
De tal forma, a verdade enquando uma questão da existência não se esgota numa definição secular dogmatica, nem portanto relativista, pois pressupõe uma abertura na existência que deve ser adentrada e experienciada no nada, o véu que deve se retirado num determindado acontecimento (Ereignis).
A minha verdade! A verdade do outro! A verdade dos vencedores! A verdade dos perdedores! A verdade da ciência! A verdade da metafísica! A verdade….verdade… !?? Se esgotam em seus discursos !!
O homem foi lançado no mundo, e desde então o mundo é homem e o homem é mundo. Dai a angustia que no nada que encobre o ser se revela!
__________________________________
não possuimos mais a verdadei !
olhe ao redor
vaculhe o lixo
sinta o odor que dele exala!
observe o trabalho dos vermes
a devorarem os despojos
sobras de civilização
ouça o zunido das moscas varejeiras
(talvez seja apenas isso que precisamos!)
adentre as ruínas
vasculhe os escombros
chore sobre os corpos
mutilados pela guerra
se alimente dos restos
de carne apodrecida
beba o sangue pisado
dos herois mendingos
assassinados na noite fria
da história
(talvez apena isso o mantenha vivo !)
sinta o mêdo
impresso nos olhos vitrificados
dos cadaveres seculares
amontoados nos campos
e nas cidades
se espante
ante o espanto
estampado na face do anjo
a observar a catastrofe !
Banhe-se nas águas
lamacentas do tempo
atente-se ao assovio
do vento
(talvez apenas isso o redima...)
ouça bem
não tente lutar
contra a tempestade
que o arrasta
em direção ao futuro…
e não se engane!
Não se deixe cegar
pelo brilho intenso
das luzes fugazes
das infinitas estrelas
que já se apagaram
anos luz
nem tampouco
deixe-se consumir
pela profunda escuridão
que brota da inefável
noite-negra
de sua alma"
Ligia - foto de Rosinha Morais |
"Sorriso de plástico" "Eu quero um sorriso de plástico pra viver os dias de ser felizes para sempre, um sorriso de plástico que acabe de vez com este riso amarelo tatuado nos meus lábios. Não sou dada a fazer cena, mas preciso de um pouco de soda cáustica pra desmanchar este meu olhar de mosca morta de quem acredita em contos da carochinha, mel puro de abelha e um amor de carteirinha.
Ah sim já acreditei na felicidade como verdade absoluta, que ao final do arco ires tinha um pote enorme de tesouro que acabaria com todos os problemas do mundo, nunca mais mendigos debaixo do viaduto, nunca mais crianças no farol, ninguém sem um prato de comida, poderiam até se empanturrar porque remédios e médicos, sempre disponíveis, sem essa coisa de ver a cor da pele ou o dinheiro que se tem no bolso, o importante são as vidas.
Mas conta outra, a verdade? A verdade é um monstro de olhos perfurados e fundos que carrega um machado afiado pra me quebrar as pernas sempre bambas e fico pendendo pra um lado e pro outro tentando me esquivar das tretas pesadas que nos enfiam goela abaixo, empurrando com um cano apertado no esôfago. Eu tenho dor no estômago logo cedo quando amanhece o dia.
Fico ensaiando pra abrir a única janela do cubículo onde habito, é preciso espantar o mofo, o mal cheiro do banheiro misturado com a comida do dia anterior e ainda tem o mijo do gato no tapete. Mas sei que se abrir vou querer fechar os olhos pro menino estirado no chão com um buraco no meio da barriga, só mais um pra estatística, fico ouvindo a mãe desesperada gritando provavelmente é dona Maria das Dores, que perdeu o mais velho do mesmo jeito no ano passado, ele só tinha 17 anos.
Eu quero um sorriso de plástico permanente desses que duram 300 mil anos pra desmanchar no solo infértil da minha boca, traga junto um bocado de cianureto, porque a verdade é que eu preciso de uma substância altamente tóxica pra que a morte destes sorrisos forçados seja rápida. Mas ainda é cedo e eu nem escovei os dentes, preciso pôr o lixo na rua e varrer as folhas que me entopem a porta."
Foto Sueli Kimura |
1.
Parecia adormecido o seu menino ali deitado. A escorrer pelos pulsos, o sangue, da cor do batom em seus lábios.
A verdade, trancada a sete chaves, é que ele próprio não teve forças para abrir o armário e socorrê-lo.
2.
Sangue, da cor do batom
Escorre de dentro do armário
Onde a verdade se esconde
Sueli - foto de Rosinha Morais |
A verdade etílica
É a verdade cênica
Da mentira explícita
Depõe máscaras
Mostrando a feiura
Que o outro ignora
A verdade desejada
É a verdade exilada
A mentira expoe
Todos os defeitos
Que nos habita
.....
Há vezes
Em que a verdade
Mergulha no escuro
É sentida
Em sua plenitude
Acalma a inquietude
Compensa os males
Sustenta a cura
Travestida de loucura
Essa verdade é quente
Urgente
Desesperada
Grita através dos olhos
De quem nada fala
Gilberto - foto de Rosinha Morais |
Todas as verdades sobre Rosa (versão 1 - apresentada no I&I)
Chamava-se Rosa e morava no subúrbio. De segunda a sábado vendia tranqueiras na loja do tio. Tomava metrô e ônibus. E almoçava cachorro-quente. Vivia essa sina, entre apertos e encontrões, à duras penas, até que conheceu Ricardo. Era gordo e simpático. Foi Lurdinha quem o apresentou, numa festa no bairro.
Bonachão e tranqüilo, certa vez a convidou para jantar. Saíram duas, três, várias vezes. Depois de alguns sábados, chegaram àquele motelzinho chinfrim.
Inadvertida, aceitou o vinho que ele ofereceu. Era doce. Não podia, porém. Tinha problemas de pressão. Não estava acostumada. Sorveu o primeiro cálice. O licor era doce como mel. Pediu mais uma dose com olhinhos úmidos. Tomou e gostou. Pediu com voz licorosa. Ele serviu-a mais uma vez. Passou mal depois, antes mesmo de se tocarem. Ele duvidou. Fez perguntas, desconfiado. Ela pendia a cabeça prum lado e pro outro, amolecida. Suas carnes agora já estavam amareladas. Vomitou.
Diante de tantos inconvenientes e talvez por polidez, Ricardo se deu por vencido. Desceu do seu tesão e começou a se vestir. Queria ir embora rápido. Então ela desmaiou, num esgar atônito e as mãos crispadas. Ele ficou ali, com o olhar besta, sem saber se acudia e fugia.
Parado, a mente trabalhou instintiva. Refletiu rápido: era casado, já conhecido da recepcionista lá fora, tinha que trabalhar na manhã seguinte. Resolveu ir embora. Passou na saída, pagou uma pernoite, explicou por alto a história, ofereceu uma gorjeta para a colega e foi embora.
Em casa foi tudo bem. A mulher teve o homem à altura.
Quando acordou na manhã seguinte, foi saudado pela esposa. Tomou uma café rápido, checou o celular – ficava desligado à noite. “Ligar para Marcela, telefone 24... com urgência!”
Quem era Marcela?
Apagou, anotou o número. Mais tarde, fez a ligação do escritório: “Motel Splash, bom dia!...” Desligou. Consultou.
Ficou muito tempo ruminando. “Quem era Marcela?”
“Era a recepcionista?” A manhã toda foi assim. A voz que ficara nas duas secretárias era semelhante mas... “Como será a voz dela? Só eu que falo. Chego e pum, tá feito! Será que algum dia ela já falou comigo? Não! Aquela voz que eu ouvi cedo era igual ao olhar dela. É por isso que tenho certeza que foi ela. Mas... Por quê?” Ricardo ficou assim, perdido num devaneio longo e abstrato. Há anos que chegava ali, com companhia diversa. E – disso tinha certeza – há anos que ela trabalhava ali. É de se acreditar que sequer prestava atenção nele. Era sempre a mesma história. Ele encostava o carro, buzinava, ela abria uma cortina, um sorriso de mármore pela fresta no vidro e recolhia o cartão ou o cheque em branco. Ele pedia a suíte de sempre, recebia a chave, encomendava a pizza e o vinho, e entrava. Depois saía, assinava o cheque ou o boleto e ia embora. Como era o tom de voz daquela moça?
No vazio dos instantes naquela manhã nebulosa, percebeu que apesar da aflição daqueles recados aflitos(aflitos?), e da noite muito mal aproveitada, aquiescia aquele sorriso sério àquela voz tônica. Tudo bem que toda recepcionista de motel tem voz igual mas aquela voz... aquela voz – se é que era dela – era intensa. Não era de uma secretária de gozos a varejo. Tinha a impostura de um arcanjo translúcido, um viés infantil, que entorpecia. “Ligar para Marcela”. Quem era Marcela?
Voz esganiçada em desespero malicioso, licor tinto para desejos impudicos. “Ligar para Marcela”. Era rouca. Tinha uma aspereza de fulgor urgente. Cristalina e simpática como um obséquio.
Aos trinta e poucos anos, tem-se a impressão de que o mundo nos pertence. Ou pertence mesmo? Sem a lubricidade da juventude nem os atributos temporãos, é de se refletir se realmente estar ao meio da senilidade não seria apropriar-se da melhor parte do bolo. Quem era Marcela?
O celular tocou de novo. Atendeu. Era Marcela. Cumprimentaram-se nervosos.
“Mas o que foi que aconteceu?”
“Como?”
“Ontem à noite...”
“Ah... nada de mais. A menina bebeu vinho de mais. Desmaiou. Só isso. Foi por isso que paguei dobrado.”
“Ahhh...”
“Fiquei contente por você ter me ligado. Onde foi que achou meu telefone?”
“Na sua fatura do cartão.”
“Ah...”
“Eu...”
“Não. Não precisa dizer nada. E fiquei muito contente mesmo por você ter me ligado. Juro. Ah, e tem mais. Hoje eu tô com o meu dia meio complicado mas, como você sabe, às vezes eu tenho as tardes livres...”
“Não!”
“A gente poderia ir tomar um vinho.”
“É que...”
“Não gosta de vinho?”
“Gosto. Gosto muito, mas é que...”
“Pode deixar, vou imaginar um lugar soss...”
“Não é isso agora. É que... que... aconteceu...”
“O quê?”
“Como eu poderia te dizer?”
“Dizer o quê?”
“Bem... é o seguinte. Queria que você... o senhor, fosse a um velório. É isso. Pronto. É isso mesmo.”
“Ve... ve...”
“É isso mesmo. Da minha prima. Morreu essa madrugada.”
..........
Todas as verdades sobre Rosa (versão 2 – corrigida após comentários)
Chamava-se Rosa e morava no subúrbio. De segunda a sábado vendia tranqueiras na loja do tio. Andava de metrô e ônibus e almoçava cachorro-quente. Vivia essa sina, entre apertos e encontrões, à duras penas, até conhecer Ricardo. Foi Lurdinha quem apresentou aquele gordo bonachão, numa festa no bairro.
Boa-praça e tranqüilo, certa vez ele a convidou para jantar. Saíram duas, três, várias vezes. Depois de algumas fomes saciadas, chegaram àquele motelzinho chinfrim.
Inadvertida, aceitou o vinho que ele ofereceu. Não podia, porém. Tinha problemas de pressão. Não estava acostumada. Sorveu o primeiro cálice. O licor era doce como mel. Criou coragem e pediu mais uma dose com olhinhos úmidos. Mais uma? A voz, licorosa. Ele serviu-a de novo. Ela passou mal depois, antes mesmo de se tocarem. Ele, desconfiado, sondou, fez perguntas, duvidou. Ela, amolecida, pendia a cabeça pros lados. Suas carnes agora já estavam amareladas. Vomitou.
Diante de tantos inconvenientes e talvez por polidez, Ricardo desistiu, se deu por vencido. Desceu do seu tesão e começou a se vestir. Queria ir embora rápido. Então ela desmaiou, num esgar atônito e as mãos crispadas. Ele ficou ali, com o olhar besta, sem saber se acudia ou fugia.
Parado, a mente instintiva, refletiu rápido: era casado, já conhecia a recepcionista lá fora, tinha que trabalhar na manhã seguinte. Resolveu ir embora. Na saída, pagou a pernoite, explicou por alto a história, ofereceu uma gorjeta para a colega e foi embora.
Em casa foi tudo bem. A mulher teve o homem à altura.
Quando acordou na manhã seguinte, foi saudado pela esposa. Tomou uma café rápido, checou o celular – ficava desligado à noite. “Ligar para Marcela, telefone 24... com urgência!”
Quem era Marcela?
Apagou, anotou o número. Mais tarde, fez a ligação do escritório: “Motel Splash, bom dia!...” Desligou. Consultou.
Ficou muito tempo ruminando. “Quem era Marcela?”
“Era a recepcionista?” A manhã toda foi assim. A voz que ficara nas duas secretárias era semelhante mas... “Como será a voz dela? Só eu que falo. Chego e pum, tá feito! Será que algum dia ela já falou comigo? Não! Aquela voz que eu ouvi cedo era igual ao olhar dela. É por isso que tenho certeza que foi ela. Mas... Por quê?” Ricardo ficou assim, perdido num devaneio longo e abstrato. Há anos que chegava ali, com companhia diversa. E – disso tinha certeza – há anos que ela trabalhava ali. É de se acreditar que sequer prestava atenção nele. Era sempre a mesma história. Ele encostava o carro, buzinava, ela abria uma cortina, um sorriso de mármore pela fresta no vidro e recolhia o cartão ou o cheque em branco. Ele pedia a suíte de sempre, recebia a chave, encomendava a pizza e o vinho, e entrava. Depois saía, assinava o cheque ou o boleto e ia embora. Como era o tom de voz daquela moça?
No vazio dos instantes naquela manhã nebulosa, percebeu que apesar da aflição daqueles recados aflitos (aflitos?), e da noite muito mal aproveitada, aquiescia aquele sorriso sério àquela voz tônica. Tudo bem que toda recepcionista de motel tem voz igual mas aquela voz... aquela voz – se é que era dela – era intensa. Não era de uma secretária de gozos a varejo. Tinha a impostura de um arcanjo translúcido, um viés infantil, que entorpecia. “Ligar para Marcela”. Quem era Marcela?
Voz esganiçada em desespero malicioso, licor tinto para desejos impudicos. “Ligar para Marcela”. Era rouca. Tinha uma aspereza de fulgor urgente. Cristalina e simpática como um obséquio.
Aos trinta e poucos anos, tem-se a impressão de que o mundo nos pertence. Ou pertence mesmo? Sem a lubricidade da juventude nem os atributos temporãos, é de se refletir se realmente estar ao meio da senilidade não seria apropriar-se da melhor parte do bolo. Quem era Marcela?
O celular tocou de novo. Atendeu. Era Marcela. Cumprimentaram-se nervosos.
“Mas o que foi que aconteceu?”
“Como?”
“Ontem à noite...”
“Ah... nada de mais. A menina bebeu vinho de mais. Desmaiou. Só isso. Foi por isso que adiante aquela grana, sabe?”
“Ahhh...”
“Fiquei contente por você ter me ligado. Onde foi que achou meu telefone?”
“Na sua fatura do cartão.”
“Ah...”
“Eu...”
“Não. Não precisa dizer nada. E fiquei muito contente mesmo por você ter me ligado. Juro. Ah, e tem mais. Hoje eu tô com o meu dia meio complicado mas, como você sabe, às vezes eu tenho as tardes livres...”
“Não!”
“A gente poderia ir tomar um vinho.”
“É que...”
“Não gosta de vinho?”
“Gosto. Gosto muito, mas é que...”
“Pode deixar, vou imaginar um lugar soss...”
“Não é isso agora. É que... que... aconteceu...”
“O quê?”
“Como eu poderia te dizer?”
“Dizer o quê?”
“Bem... é o seguinte. Queria que você... o senhor, fosse a um velório. É isso. Pronto. É isso mesmo.”
“Ve... veló...”
“É isso mesmo. Da minha prima. Morreu essa madrugada.”
Chamava-se Rosa e morava no subúrbio. De segunda a sábado vendia tranqueiras na loja do tio. Andava de metrô e ônibus e almoçava cachorro-quente. Vivia essa sina, entre apertos e encontrões, à duras penas, até conhecer Ricardo. Foi Lurdinha quem apresentou aquele gordo bonachão, numa festa no bairro.
Boa-praça e tranqüilo, certa vez ele a convidou para jantar. Saíram duas, três, várias vezes. Depois de algumas fomes saciadas, chegaram àquele motelzinho chinfrim.
Inadvertida, aceitou o vinho que ele ofereceu. Não podia, porém. Tinha problemas de pressão. Não estava acostumada. Sorveu o primeiro cálice. O licor era doce como mel. Criou coragem e pediu mais uma dose com olhinhos úmidos. Mais uma? A voz, licorosa. Ele serviu-a de novo. Ela passou mal depois, antes mesmo de se tocarem. Ele, desconfiado, sondou, fez perguntas, duvidou. Ela, amolecida, pendia a cabeça pros lados. Suas carnes agora já estavam amareladas. Vomitou.
Diante de tantos inconvenientes e talvez por polidez, Ricardo desistiu, se deu por vencido. Desceu do seu tesão e começou a se vestir. Queria ir embora rápido. Então ela desmaiou, num esgar atônito e as mãos crispadas. Ele ficou ali, com o olhar besta, sem saber se acudia ou fugia.
Parado, a mente instintiva, refletiu rápido: era casado, já conhecia a recepcionista lá fora, tinha que trabalhar na manhã seguinte. Resolveu ir embora. Na saída, pagou a pernoite, explicou por alto a história, ofereceu uma gorjeta para a colega e foi embora.
Em casa foi tudo bem. A mulher teve o homem à altura.
Quando acordou na manhã seguinte, foi saudado pela esposa. Tomou uma café rápido, checou o celular – ficava desligado à noite. “Ligar para Marcela, telefone 24... com urgência!”
Quem era Marcela?
Apagou, anotou o número. Mais tarde, fez a ligação do escritório: “Motel Splash, bom dia!...” Desligou. Consultou.
Ficou muito tempo ruminando. “Quem era Marcela?”
“Era a recepcionista?” A manhã toda foi assim. A voz que ficara nas duas secretárias era semelhante mas... “Como será a voz dela? Só eu que falo. Chego e pum, tá feito! Será que algum dia ela já falou comigo? Não! Aquela voz que eu ouvi cedo era igual ao olhar dela. É por isso que tenho certeza que foi ela. Mas... Por quê?” Ricardo ficou assim, perdido num devaneio longo e abstrato. Há anos que chegava ali, com companhia diversa. E – disso tinha certeza – há anos que ela trabalhava ali. É de se acreditar que sequer prestava atenção nele. Era sempre a mesma história. Ele encostava o carro, buzinava, ela abria uma cortina, um sorriso de mármore pela fresta no vidro e recolhia o cartão ou o cheque em branco. Ele pedia a suíte de sempre, recebia a chave, encomendava a pizza e o vinho, e entrava. Depois saía, assinava o cheque ou o boleto e ia embora. Como era o tom de voz daquela moça?
No vazio dos instantes naquela manhã nebulosa, percebeu que apesar da aflição daqueles recados aflitos (aflitos?), e da noite muito mal aproveitada, aquiescia aquele sorriso sério àquela voz tônica. Tudo bem que toda recepcionista de motel tem voz igual mas aquela voz... aquela voz – se é que era dela – era intensa. Não era de uma secretária de gozos a varejo. Tinha a impostura de um arcanjo translúcido, um viés infantil, que entorpecia. “Ligar para Marcela”. Quem era Marcela?
Voz esganiçada em desespero malicioso, licor tinto para desejos impudicos. “Ligar para Marcela”. Era rouca. Tinha uma aspereza de fulgor urgente. Cristalina e simpática como um obséquio.
Aos trinta e poucos anos, tem-se a impressão de que o mundo nos pertence. Ou pertence mesmo? Sem a lubricidade da juventude nem os atributos temporãos, é de se refletir se realmente estar ao meio da senilidade não seria apropriar-se da melhor parte do bolo. Quem era Marcela?
O celular tocou de novo. Atendeu. Era Marcela. Cumprimentaram-se nervosos.
“Mas o que foi que aconteceu?”
“Como?”
“Ontem à noite...”
“Ah... nada de mais. A menina bebeu vinho de mais. Desmaiou. Só isso. Foi por isso que adiante aquela grana, sabe?”
“Ahhh...”
“Fiquei contente por você ter me ligado. Onde foi que achou meu telefone?”
“Na sua fatura do cartão.”
“Ah...”
“Eu...”
“Não. Não precisa dizer nada. E fiquei muito contente mesmo por você ter me ligado. Juro. Ah, e tem mais. Hoje eu tô com o meu dia meio complicado mas, como você sabe, às vezes eu tenho as tardes livres...”
“Não!”
“A gente poderia ir tomar um vinho.”
“É que...”
“Não gosta de vinho?”
“Gosto. Gosto muito, mas é que...”
“Pode deixar, vou imaginar um lugar soss...”
“Não é isso agora. É que... que... aconteceu...”
“O quê?”
“Como eu poderia te dizer?”
“Dizer o quê?”
“Bem... é o seguinte. Queria que você... o senhor, fosse a um velório. É isso. Pronto. É isso mesmo.”
“Ve... veló...”
“É isso mesmo. Da minha prima. Morreu essa madrugada.”
Foto Luka Magalhães |
Poemas de Inês Santos:
VERDADE DE TODOS
Vou contar uma verdade
Que não é só minha
Que não é só sua
É de todos nós
Nascemos todos
De um útero
E desde então
Um dia ...
Morreremos!
PROPORCIONALIDADE
Proporcionalmente
Mentiras e verdades
Revelam realidades.
POLÍTICO
E CONTRADITÓRIO
:
O discurso
Foi de verdade
Mas as palavras
Proferidas
Eram todas
Mentiras.
A VERDADE
:
Procuro sempre
A minha
Nem sempre
A encontro.
FRAGILIDADE
:
A verdade
Tirou a roupa
Da mentira
Para ver
Sua realidade
De verdade.
Digite uma mensagem...
Inês - foto de Rosinha Morais |
Texto de Luka Magalhãesn (ambigrama da palavra "verdade", que suscitou um profundo debate sobre filosofia e poética):
Luka - foto de Rosinha Morais |
Textos de Mário Neves:
A VERDADE
Do púlpito o pastor se despedia dos fieis em mais um encontro dominical, sem antes deixar a todos uma tarefa. Estudar o capitulo vinte e cinco do Evangelho de Lucas ao qual seriam feitas algumas perguntas no culto seguinte. Todos se foram e como uma semana passa rápido e os afazeres são tantos. chegou de novo o domingo sem que este compromisso fosse cumprido por aquele atarefado povo, pelo menos ficou essa impressão. A negligência foi geral.
Novamente no púlpito e diante do povo o pastor pergunta:
Quem estudou o capítulo de Lucas?
Um silêncio constrangedor tomou conta da plateia.
Então? Quem cumpriu a tarefa levante a mão!
Ninguém queria confessar a sua omissão e quase toda a assembleia e levantou o braço.
Retomando a palavra o pastor disse:
Irmãos hoje estamos aqui para falar da verdade, e falando a verdade o Evangelho de Lucas termina no capítulo vinte e quatro, portanto não há o capítulo vinte e cinco.
Todos os presentes envergonhados e sem saber onde se esconder sentiram nesse momento a força e o verdadeiro sentido do vocábulo verdade, e mais que isso quanto é humilhante sentir o peso da mentira.
...
A VERDADE
Verdade absoluta quem tem é DEUS!
De resto sobram apenas
Meias verdades...e mentiras inteiras...
Há verdade e verdades e essa palavra,
Talvez seja o vocábulo mais intrínseco da fala humana.
A verdade de cada pessoa, defendida até com bravura,
Pode vir a ser uma mentira no correr do tempo ou vice-versa
A versão “verdade” de cada um é particular, mutante,
efêmera, transitória feita um bumerangue,
Que lançado ao ar, corcoveia em parábolas e círculos,
Mudando repentinamente de direção.
A verdade real, a verdadeira, é um vernáculo,
Puro, justo, divino,
Um vocábulo exclusivo de DEUS,
Uma palavra que em seu sentido exato,
Somente poderá ser encontrada
No dicionário perfeito do CRIADOR.
Há a verdade de DEUS
E as nossas “ verdades ” ...
E ponto final.
Miotto - foto de Rosinha Morais |
Texto de Antonio Miotto:
Texto de Richard Nunes:
O conceito de verdade
A evidência é um dos fundamentos da verdade.
A evidência: a mente daquele que conhece adere plenamente ao objeto do seu conhecimento, sem padecer de dúvida quanto à realidade do que ele capta.
Essa evidência manifesta-se de dois modos:
1-Evidência interior é aquela que emana na interioridade do homem, que temos da nossa existência pela afirmação da nossa própria consciência.
2-Evidência exterior: é aquela que se dirige ao mundo objetivo. Aquela que se realiza no mundo objetivo. Assim, por exemplo, a evidência intuitiva captada pelos sentidos da existência de alguma coisa que tocamos que apalpamos que vemos etc.
Mas esses dois tipos de evidências permitem dois tipos de classificação:
A evidência interior pode ser imediata, isto é, sem meios, como exemplo dado da consciência. consciência de nós mesmos, cuja existência é uma evidência interior imediata para nós.
E uma evidência interior mediata é aquela que realizaríamos por qualquer meio, como exemplo, alcançarmos a conclusão num silogismo. Pois dadas duas premissas, a uma das quais há um termo médio, graças a esse termo médio, nós chegamos a uma conclusão. Quer dizer, a evidência interior mediata é aquela que se faz por meio de um termo médio.
Quanto à evidência exterior ela também pode ser mediata ou imediata:
A imediata como no exemplo citado, se dá ao conhecimento sensível.
A mediata que se processa através de meios seria evidência que nos dá a experiência científica para exemplificar.
Mas o conceito de verdade implica em quando tomado na sua generalidade em sentido lato, há alguma conformidade entre dois extremos. Quando nenhum desses extremos é o intelecto, nós temos a verdade no sentido mais lato possível. Quando se diz, por exemplo, a pedra verdadeira, a mesa verdadeira.
Mas quando um desses dois termos é o intelecto, então nós temos a verdade tomada num sentido mais restrito. Quando dizemos, por exemplo, este objeto é uma mesa.
Em neste último sentido, que os antigos filósofos, definiram a verdade.
Assim, por exemplo, na verdade lógica, há uma adequação, uma conformidade entre a coisa e a formalidade correspondente.
A verdade metafísica já seria a adequação entre a forma e a coisa.
A verdade material é considerada a todas as suas notas e propriedades segundo também a toda a sua compreensão e também segundo a sua realidade fora de nós.
O conjunto de todas essas verdades dando-nos uma evidência plena seria a verdade concreta.
De que verdade quereria falar Pilatos a Cristo, por exemplo?
É a verdade que em geral procuram os agnósticos e os céticos, não é adequação entre dois termos, seria a fusão de ambos em um termo só.
Seria aquela verdade que seria total e exaustivamente a expressão da própria coisa. Ora, esta verdade, não é de modo algum captável nem possível a um ser limitado e deficiente como o Ser Humano.
Este não pode ter em sua plenitude uma verdade de fusão, mas apenas uma adequação intencional entre seu intelecto e a coisa. Nunca de uma fusão absoluta com a própria coisa por que ele é um ser que tem limites marcados pela sua finitude.
Fazendo um adendo, por linhas gerais, pode-se levar em consideração que a verdade não pode ser dita, verbalizada e muito menos pensada. Ela pode apenas ser reconhecida pelo indivíduo.
Arte de Luka Magalhães |