A Casa Amarela – Espaço Cultural, localizada em São Miguel Paulista (SP), iniciou suas atividades em Março de 2011 e foi pensada para, em todos seus ambientes, respirar a criação humana e seus desdobramentos onde música, teatro, literatura, cinema, artes visuais, filosofia, história ou simplesmente a conversa entre seus visitantes possa ser aconchegante e convidativa para novas descobertas.
Mariana Félix, cronista social e poeta delicada (foto EF)
Wolf do Vale e a prole (foto EF)
O poeta Carlos Moreira, de Rondônia, em visita à CA (foto EF)
Domingo combina com: ir ao parque, comer frango com macarrão, assistir...Um desfile de talentos, uma reunião de pessoas, uma porção, dupla, de alegria.
O dia 10 de julho teve tudo isso e um pouco mais, para quem resolveu responder a chamada do Mestre Akira e compareceu ao 46º Sarau da Casa Amarela. O calor trocado era tão intenso que ninguém lembrou que vivíamos um domingo de inverno. Domingo de inverno sim, mas friozinho mesmo, só aquele que dá na barriga antes de subir ao palco. Para celebrar a poesia e a amizade os domingos de Sarau da Casa Amarela se veste de todas as estações. Se faz outono, onde as folhas caem para garantir umidade suficiente ao chão durante o inverno e fazer brotar, na primavera, poetas e poesias compostas em seu solo. E o verão é feito de abraços sinceros e carregados de emoção. A emoção foi garantida pelos habitantes frequentes e por quem pisava pela primeira vez no palco da Casa Amarela.
Os Convidados especiais do dia foram Wolf do Vale, Mariana Felix e Carlos Moreira.
Após a abertura, pelo grande Mestre Akira Yamasaki, com uma bela homenagem aos amigos que partiram, Rosemari Beltrão e Marco Antonio Franchi, teve início mais uma linda festa de música, poesia e amizade.
Wolf, músico e agitador cultural, da vizinha cidade de Guarulhos, era um dos estreantes na Casa e trouxe junto com ele, sua prole, Lucas e Daniel Golinelli, cujo talento ficou claro no primeiro toque. Falou sobre o trabalho dele, tanto musical quanto cultural e apresentou sua música, sua poesia e sua emoção, traduzida em lágrimas durante a declamação de um poema composto em sua juventude.
Mariana Felix, poeta e slamer, retornou à Casa para o lançamento do seu livro Mania, livro que por sinal, eu recomendo. Desfilou sua poesia impregnada de significados, mostrando que a força dos jovens poetas e das mulheres não podem mais ser ignorada, porque traz uma poesia que fala com propriedade e sem disfarces, às vezes, de uma forma tão real que fere, fere a mente, inquietando-a.
Carlos Moreira, poeta maior, retornou à Casa e emocionou, arrancou admiração dos que ainda não o conhecia e ainda mais respeito daqueles que acompanham o seu talento e o seu trabalho, mostrando que o poeta se refina com o tempo, tornando-se essencial, como o Akira sempre repete.
A música ficou por conta dos talentosos:
Wolf do Vale, Yuri Witez Corttlich, Silvio Kono, Beto Rios, Eder Lima e Lígia Regina, Tião Baia, Lucas Golinelli, Daniel Golinelli, Carlos Bacelar, Paulo Miranda, Victor Cali e Osvaldo Tiveron que divertiu a todos com a sua paródia musical.
A poesia, com direito ao nascimento de uma nova poeta, contou com representantes de peso:
Mariana Felix, Carlos Moreira, Mário Neves, Rosinha Morais, Silvia Maria Ribeiro, Inês Santos, Osvaldo Tiveron, Enide Santos, Gilberto Braz, Escobar Franelas, José Pessoa, Francis Gomes, Manogon, Tiago Bode, Fernando Medeiros, Joel Filho, João Caetano, Euflávio Góis.
Escobar Franelas, Luka Magalhães e Akira Yamasaki, revezaram-se no palco, apresentando convidados e poesias.
A casa teve a visita sempre iluminada de Clarice Yamasaki.
Por fim e tão importante quanto tudo e todos, a presença marcante da Sueli Kimura, recepcionando cada um dos visitantes com seu sorriso acolhedor.
Rosinha Morais, poeta
Akira Yamasaki, mentor e apresentador do Sarau da CA (foto EF)
Yuri Witez, talento e simpatia na mesma proporção
O público é o sarau (foto EF)
Público levantando poeira no fim do sarau (foto EF)
Sarau acabou. Hora de pensar na segunda-feira (foto EF)
Como é praxe no I&I, o encontro do dia 2 de julho de 2016 reservou uma vivência físico-corporal e meditativa conduzida por Sueli Kimura, que serviu como um "esquenta" para o início das atividades. Logo após, o Luka Magalhães deu início à apreciação dos textos produzidos a partir do tema que ele propôs: herói.
Eis o primeiro, de Eliana Mara:
Um herói de passagem
Herói de tantas lutas, desde os tempos em que se apoderou do fogo e deu início à forja dos artefatos de guerra.
Carregou indefinidamente a pedra grande até o topo da montanha.
Peregrinou pelos desertos levando mensagens cifradas.
Cuidou das feridas dos leprosos.
Perdeu-se na guerra.
Despiu-se na frente dos bispos e foi cuidar dos passarinhos.
Com seu arco e flecha honrou seus antepassados.
Vingou a morte de uma mulher violentada.
Apagou fogos impossíveis.
Morreu dentro de uma bomba em nome de seu deus.
Junto com seu bando fez a vingança desejada.
E não chorou na véspera de ser enforcado.
Salvou a vida do bebê abandonado na lata do lixo.
Fez canções de liberdade para o mundo inteiro ouvir.
Ficou preso num porão e foi torturado sem delatar seus companheiros.
Descobriu a cura da tuberculose.
Inventou a lâmpada.
Desenhou um grito para sempre.
Não atirou na criança destemida.
Hoje anda pelas ruas com seu cobertor alado, disfarçado de mortal.
A poeta Rosinha Morais trouxe inquietações e reticências em forma de poesia:
Como está:
Talvez eu escreva sobre algo
Talvez
Talvez eu escreva sobre o talvez
Talvez sobre a certeza
Talvez eu passe ao presente
Talvez eu escreva sobre o passado
Sobre aquele desejo tão íntimo
Ou, talvez, possa escrever
Que talvez no futuro se realize
Dessa incerteza que talvez o amor seja
Talvez eu fale de amor
Talvez eu grite teu nome
Num poema que talvez escreva
O talvez seja a minha certeza.
Talvez num deslize qualquer Como é/foi
Talvez eu escreva sobre algo
Talvez
Talvez eu escreva sobre o talvez
Talvez sobre a certeza
Talvez eu escreva sobre o passado
Talvez eu passe ao presente
Ou, talvez, possa escrever
Sobre aquele desejo tão íntimo
Que talvez no futuro se realize
Talvez eu fale de amor
Dessa incerteza que talvez o amor seja
Talvez eu grite teu nome
Num poema que talvez escreva
Talvez num deslize qualquer
O talvez seja a minha certeza
A sempre surpreendente Enide Santos dessa vez não pode participar, pois estava na FLIP, mas depois mandou-nos o texto que, infelizmente, não pudemos discutir no dia:
Certo herói
Magro, rosto amarelado
cabelo todo desgrenhado
exalando forte odor
mãos e braços fadigados
medos e sonhos estancados
enterrados pela dor
Cicatrizes e feridas abertas
lista de amigos desertas
solidão por acontecer
seria este o fim da historia
de um certo herói sem memória
que o destino tentou esquecer
mas o amor com presteza sabota
e um sonho para o sono importa
a sensação do beijo assim o corda
agora resplandece em sua espada
a bela face de sua amada
guiando-o a cada alvorecer.